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Mostrando postagens de julho, 2015

Síndrome de Arkadin

Pintura de René Magritte Uma metáfora sobre a acumulação primitiva do capital e seu registro histórico   Imagine uma pessoa sem memória, como Mr. Arkadin do memorável filme de Orson Welles (1955). Ele não conhecia a origem de sua fortuna, vítima que era de amnésia. Por isso, contratou um investigador que, ao deslindar o mistério, através de testemunhas que sabiam que Arkadin havia enriquecido durante a guerra à custa do jogo e da prostituição, propiciava ao magnata eliminar, um a um, seus incômodos cúmplices. De vítima de amnésia pessoal passou a artífice de uma amnésia social. O filme é uma metáfora sobre a acumulação primitiva do capital e seu “registro histórico”. Agora, imagine-se este papel sendo desempenhado pelo próprio Estado em benefício de uma elite que padece da síndrome de Arkadin. É o que ocorre na cidade e no interior de São Paulo. Para salvar e preservar a memória, como lançamentos de autores em coleções adequadas para a ge

O som e a imagem do País

O crescente medo pela sinceridade em nosso relacionamento social             O que será que está mudando nesta nossa moderna sociedade de consumo? O brasileiro, de uns tempos para cá, vem deixando de cantar no chuveiro? Durante milênios o homem acostumou-se a unir o seu idioma com o ritmo da música. Foi a cultura do consumo e do vencer na vida que determinou que o hábito de cantar não servia. A maioria das pessoas – por medo de ser chamadas de “sonhadoras ou bobas” – perderam sua consciência intuitiva. Distanciaram cada vez mais de nossa origem”. Por outro lado, minha gente, cantar exige profundas técnicas. Poucos têm o dom. Poucos percebem o tom certo. Como interpretar dentro do ritmo da canção?             O mundo hoje está mais complexo e as gerações atuais sem tantas esperanças. O clima é completamente diferente: as pessoas estão muito interessadas em se estruturar do que em se expressar. Uma das principais modificações foi o crescente medo

O abrigo

Ele se perdia na touceira de grama molhada que apagava o seu celular e sapatos             Lá fora, noite fria de domingo, e então me sinto um daqueles marinheiros ancorados no porto da casa, a sensação de frieza na alma quando a tarde está congelando, e então eu sinto uma falta do aconchego, uma fissura de namorado adolescente que conquista a primeira garota e penso em ti, bem devagar, como um bem-querer tão certo e limpo, tão fundo e bom que parece que estou te embalando dentro de mim. Tenho vontade de escrever bobagens para todo mundo me achar bobo, um tanto medíocre e, talvez, preencher este espaço num dia sem assunto e, entretanto hoje me sinto apenas um menino teimoso num dia cinza e encharcado. Olho-me no espelho e percebo que estou envelhecendo definitivamente com esses cabelos brancos, parece que minha imagem vai esvanecendo-se, vou ficando menos nítido, desfocando-se como os efeitos de filtro de um programa digital de imagem, como fotog

A metamorfose do pai

Opressivos laços familiares             Max Brod acertou ao incluir a Carta ao Pai entre as obras literárias de Franz Kafka. Nela, presentes o mesmo clima opressivo que caracteriza sua obra em geral e o mesmo tom metálico sustentado pelo enunciado em que a compulsão organiza um universo onde se acumulam destroços, sem falar nos temas como a culpa, o autoritarismo, a perseguição, também aqui presentes.             É verdade que o texto apresenta a peculiaridade de ser uma carta. Nela, Kafka faz uma avaliação de sua vida inteira marcada, segundo ele, pelo jugo tirânico da figura paterna. Hermann Kafka, comerciante judeu, com seu egoísmo bruto, sua mentalidade arrivista e sua negligente vulgaridade, teve uma ampla – ainda que involuntária – parcela de responsabilidade na construção da autoimagem de fracassado que Kafka deve ter carregado ao longo da vida.             Convém realçar, contudo, a carta lida com registros de memória e do que Kafka se lembra é a

Rama

Campos de algodão: nuvens emplumes atadas ao chão.

Muito macho na cozinha

Um ato pequeno de arrependimento e necessidade, de nos redimir,  perante os séculos de violência e desvalorização da mulher             Vivemos em pleno universo das transformações na moda, nos costumes e consumo. Começam a mudar com os novos “sujeitos” da culinária (homens principalmente) e a transformação da cozinha em parte nobre da casa. Uma evolução cultural ou nova sedução pelo paladar? Pela falta de emprego e outros problemas sociais que enfrentamos, surge uma figura polêmica no universo machista brasileiro: o homem doméstico. Como muitos, a sua mulher teve que assumir os compromissos com a casa e os filhos. Você sente uma mistura de complexo de inferioridade com doses de frio, que lembra medo e insegurança. Um homem que hiberna, feito o urso polar. Você treme nas bases!             O frio faz evocar nomes como massas, assados, vinhos e outras guloseimas, ou iguarias. Recentemente, o destaque que vêm ganhando sobre a ajuda do homem nas t