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Turismo no campo



Depois que houve a mecanização da vida diária,
acompanhada com o inchaço e violência da cidade,
 as pessoas optaram por retornar às origens




Um dos grandes fenômenos que ocorreu no Brasil, há 21 anos, foi o êxodo rural, por falta de política de incentivo agrícola do Governo. Naquela época, desmotivado, o produtor rural via os centros urbanos como a luz no fim do túnel. À primeira vista, o entusiasmo diante da cidade, aos transeuntes, caminhando pelas calçadas, que as suas mulheres possam parar, olhar as vitrines, contemplar o contraste entre o luxo e a miséria e, finalmente, à noite,  perder-se nos sonhos pela ofuscante luz de néon. Em termos de Brasil, as cidades estão sendo construídas e, muitas vezes, reconstruídas sem propósitos humanos, mas atendendo somente às exigências tecnológicas e imobiliárias. Não surpreende, portanto, o caráter desumano visível. Descompassadas em seu aspecto arquitetônico, poluídas, auditiva e visualmente, enredadas em suas próprias contradições.
Será que um dia, firmaremos um pacto para evitar o risco de deteriorar o ambiente em que se desenvolve a única coisa realmente insubstituível, que é a nossa vida! Há uma certa unanimidade entre antropólogos, sociólogos e geógrafos urbanos, de que em muitas regiões o Estado estrangulou a região metropolitana. Planejamento começa com a prática, e não com seminários, congressos, encontros que se prestam para viagens de recreio, mordomias e pouca ação concreta. Quando o administrador entra no esquema do viaduto, do edifício-garagem, como solução ao transporte de massa, torna-se evidente que o homem foi derrotado pela máquina. As cidades são o que os administradores querem. Tendência não é destino. A cidade nessa luta contra a falta de um plano diretor, ou, planejamento urbano, tem que agir com urgência.
De qualquer maneira, parece que o brasileiro sonha em viver no campo, pois a situação de 2002 para cá se inverteu. Hoje, com tanta estrada, todo mundo viaja de carro, moto ou ônibus, como na inesquecível canção de Sá, Rodrix e Guarabira sobre a casa no campo. Depois que houve a mecanização da vida diária acompanhada com o inchaço e a violência da cidade, as pessoas optaram por retornar às origens, portanto, saudemos alegremente a sua volta. A linha de São Paulo – Minas Gerais tanto serve para viajantes comuns como para turistas. Uma viagem feita mesmo para turistas, homens sem pressa, lá onde tem a água limpa e cristalina das cachoeiras de Santa Bárbara d´Oeste... Não seria difícil organizar em cada um desses lugares um programa singelo, um almoço, uma pescaria, um passeio a cavalo atravessando as matas.
Fico pensando em outras viagens dessas para o Norte e para o Sul, penso em pequenos patrimônios e distritos localizados no interior de Minas Gerais -, sem falar nos lugares mais humildes e, às vezes, tão gostosos -, passar pelo Mato Grosso e Mato Grosso do Sul ou, voltando para o Rio Grande do Sul, além de conhecer as cidades que rodeiam Porto Velho, em Rondônia.
Até agora, apareceram poucas iniciativas particulares que organizam esses pequenos passeios pelo campo; acho que as pequenas prefeituras, em crise financeira, deveriam estimular qualquer ação nesse sentido, pois é na base do turismo interno, conhecido como ecoturismo, feito por brasileiros, que poderemos ter um dia estes passeios para gente de fora, a viagem pelas matas selvagens, águas, pelos pulmões e artérias do coração do País.


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