Pular para o conteúdo principal

Imagens Zen Tropi-Haicais





Retrato de Matsuó Bashô de Watanabe Kazan














O Haicai seria uma forma poética tipicamente japonesa muito cultivada no mundo todo. No Brasil, pelo que informa Goga Massuda, haicaísta japonês e autor de “O haicai no Brasil”, livreto que desvenda os caminhos do haicai pelas terras verde-amarelas, do começo do século passado até a década de 80, essa forma poética chegou ao País por influência francesa. A novidade chegou ao Brasil no final do século XIX, sendo divulgada à elite intelectual da época pelos Relatos de Viagens, uma coletânea de autores franceses. Podemos definir o haicai como sendo um poema que procura registrar um acontecimento particular, uma impressão, um drama, uma paisagem, referindo-se ao agora do poeta, de forma simples e com sentido completo.
Seus principais representantes japoneses são: Matsuó Bashô (1644-1694), o haicaísta mais conhecido do mundo, que codificou e estabeleceu os cânones do tradicional haicai japonês, acrescentando-se na galeria os ilustres Buson, Issa e Shiki. O nosso primeiro poeta a popularizar o haicai no Brasil foi Guilherme de Almeida (1890 – 1969) no início dos anos 30, do século passado. Porém, os haicaístas nacionais são unânimes em creditar ao médico, crítico literário, ensaísta e historiador baiano, Afrânio Peixoto (1875-1947), o marco inicial do desenvolvimento do haicai no Brasil, pelo fato dele ter publicado em 1928, na Revista Excelsior, um ensaio sobre essa forma de poesia japonesa.


O Haicai Hoje



Deve-se muito a Millôr Fernandes o desenvolvimento do haicai, a partir das suas tiradas humorísticas na revista Veja entre os anos 70 e 80. Millôr deu um ar descontraído ao haicai, aproximando-o do poema-piada, eliminando a métrica, título e referências às estações do ano, contribuindo para o aparecimento de jovens poetas. No final dos anos 50, os irmãos Campos (Haroldo e Augusto) ao lado de Décio Pignatari e Pedro Xisto, teóricos do movimento concretista surgido em 1950, vão se apropriar deste tipo de poesia, buscando traduzir ou transcrever o haicai japonês para o nosso idioma.
Mas, quando falamos de haicai no Brasil, o nome de Paulo Leminski surge sempre em primeiro plano, como divulgador deste estilo de poesia menos formal do Japão. Sabe-se que, no início da década de 60, ele começou a estudar japonês, cujo interesse, segundo depoimento do seu amigo José Maria Correia à Casa Memória de Curitiba, surgiu na academia de judô em que treinava. Alinhado aos valores contraculturais e libertários dos anos sessenta, Leminski produziu uma obra tensa, densa e provocadora, como sua própria personalidade. E como Millôr, o poeta de Curitiba também produziu uma obra livre de amarras. Outros haicaístas da sua geração que merecem destaque são Alice Ruiz (ex-esposa de Leminski) e Olga Savary.
Apesar de existir a opinião de que, de um modo geral, o haicai está marginalizado em meio a uma restrita elite literária brasileira, percebe-se que poetas se enveredam por suas trilhas. No entanto, ainda se faz necessário um estudo mais aprofundado sobre o gênero, pois o que existe são apenas referências históricas e ligeiras pinceladas nos blogs literários com comentários a respeito dos trabalhos de alguns haicaístas brasileiros.



Mormaço na floresta
casca estalando
cigarras cantando.



Pequeno ninho
compartilho arroz
terno azul marinho.



Silêncio
pingos da goteira
brancas nuvens.



( Página 57 )



Estiagem

Verão, flores secas. No tapete
atordoado da noite, os insetos
amarelos fincam agulhas.



( Página 70, Cobra de Vidro, Rubens Shirassu Júnior, São Paulo, 2012. )







Comentários

Postagens mais visitadas deste blog

O PAU

pau-brasil em foto de Felipe Coelho Minha gente, não é de hoje que o dinheiro chama-se Pau, no Brasil. Você pergunta um preço e logo dizem dez paus. Cento e vinte mil paus. Dois milhões de paus! Estaríamos assim, senhor ministro, facilitando a dificuldade de que a nova moeda vai trazer. Nosso dinheiro sempre se traduziu em paus e, então, não custa nada oficializar o Pau. Nos cheques também: cento e oitenta e cinco mil e duzentos paus. Evidente que as mulheres vão logo reclamar desta solução machista (na opinião delas). Calma, meninas, falta o centavo. Poderíamos chamar o centavo de Seio. Você poderia fazer uma compra e fazer o cheque: duzentos e quarenta paus e sessenta e nove seios. Esta imagem povoa a imaginação erótica-maliciosa, não acha? Sessenta e nove seios bem redondinhos, você, meu chapa, não vê a hora de encher a mão! Isto tudo facilitaria muito a vida dos futuros ministros da economia quando daqui a alguns anos, inevitavelmente, terão que cortar dois zeros (podemos d

Trechos de Lavoura Arcaica

Raduan Nassar no relançamento do livro em 2005 Imagem: revista Usina             “Na modorra das tardes vadias da fazenda, era num sítio, lá no bosque, que eu escapava aos olhos apreensivos da família. Amainava a febre dos meus pés na terra úmida, cobria meu corpo de folhas e, deitado à sombra, eu dormia na postura quieta de uma planta enferma, vergada ao peso de um botão vermelho. Não eram duendes aqueles troncos todos ao meu redor velando em silêncio e cheios de paciência o meu sono adolescente? Que urnas tão antigas eram essas liberando as vozes protetoras que me chamavam da varanda?” (...)             “De que adiantavam aqueles gritos se mensageiros mais velozes, mais ativos, montavam melhor o vento, corrompendo os fios da atmosfera? Meu sono, quando maduro, seria colhido com a volúpia religiosa com que se colhe um pomo. E me lembrei que a gente sempre ouvia nos sermões do pai que os olhos são a candeia do corpo. E, se eles er

O Visionário Murilo Mendes

Retrato de Murilo Mendes (1951) de Flávio de Carvalho Hoje completaram-se 38 anos de seu falecimento Murilo Mendes, uma das mais interessantes e controvertidas figuras do mundo literário brasileiro, um poeta difícil e, por isso mesmo, pouco divulgado. Tinha uma personalidade desconcertante, sua vida também constitui uma obra de arte, cheia de passagens curiosas de acontecimentos inusitados, que amava Wolfgang Amadeus Mozart e ouvia suas músicas de joelhos, na mais completa ascese mística, não permitindo que os mais íntimos se acercassem dele nessas ocasiões. Certa vez, telegrafou para Adolph Hitler protestando em nome de Mozart contra o bombardeio em Salzburgo. Sua fixação contemplativa por janelas foi assunto do cronista Rubem Braga. Em 1910, presenciou a passagem do cometa Halley. Sete anos depois, fugiu do internato para assistir ao brilho de outro cometa: Nijinski, o bailarino. Em ambos os casos sentiu-se tocado pela poesia. “Na