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Inédito até quando?









“Quem escreve quer ser amado”
Roland Barthes








            Produzir na medida de sua transpiração e ritmo pessoal, com rendimentos suficientes para assegurar um padrão de vida digno, sempre foi o sonho acalentado por todo escritor. No Brasil, a maioria deles ainda enfrenta uma dura rotina de escrever nas horas vagas, no tempo que sobra no trabalho, nas redações de jornais, agências publicitárias, órgãos públicos, etc. Volta e meia chegam e-mails de leitores pedindo informações sobre editoras que se interessam por novos autores, sobre o que fazer com tantos poemas, novelas e romances guardados em casa. Onde publicá-los? Estes pedidos são o testemunho da carência de um plano municipal de cultura, enfim um escoadouro para a produção literária.
            Outros escritores preferem correr o risco de não ver os seus livros editados a abdicar de suas exigências, por terem sido caloteados por editoras e hoje só assinam contratos com acertos trimestrais e sem cessão de direitos subsidiários. O exemplo mais politicamente incorreto desta vertente seria os de Leila Míccolis, João Silvério Trevisan, Glauco Mattoso, Cláudio Feldman, entre tantos outros. O autor e diretor de teatro mais radical desta corrente era Plínio Marcos, que se recusou a entrar na tradicional estrutura do mercado, preferindo editar e vender seus livros, como um mascate.
            A alternativa ou jeito de tudo que se produz em literatura encontrar espaço de circulação ocorreu com o surgimento da internet, contendo desde os sites de relacionamento, blogs, das fan pages, possibilitando também o uso dos dispositivos móveis e dos aplicativos ou acessórios. Depois, gradativamente, vai-se depurando. Para isso fluir será necessária a organização e a cobrança dos escritores e poetas em torno da criação literária e dos direitos sindicais.
            A política cultural que se desenvolve no País ao premiar mais as obras publicadas do que as inéditas, não ajuda em nada a democratizar a produção e a circulação da literatura. Essa política, tanto municipal como do Estado, deveria priorizar a abertura de espaços alternativos, a exemplo de salas médias e pequenas de fácil acesso aos saraus literários e, de forma imprescindível, as diminuições do aluguel e dos procedimentos burocráticos, criar leis locais de incentivo a todas as áreas da cultura, as ações de formação de público e parceria com a Secretaria da Educação de Presidente Prudente, os representantes do povo em geral, privilegiando a palavra escrita, ao invés de mundo do show business.
            Seriam essas as soluções para o ineditismo - organização coletiva e fomento governamental? As dificuldades do autor estreante existem em qualquer parte do mundo. Se aqui, no Brasil, o mercado é precário, os critérios para edição são muito menos rigorosos do que na França. Aqui, ainda, se pratica o garimpo editorial. Afinal, se o livro está longe de ser o melhor papel do País, ele ainda é um investimento. Mesmo com o mercado editorial mais contido, as chances dos escritores inéditos continuam reduzidíssimas.



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