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(De)precipício Poente







O QUE EU TENHO A DIZER
SOBRE DEPRESSÃO
Katrina Petra
Relato Autobiográfico
96 Páginas
R$ 29,24
Biblioteca 24 Horas
1ª Edição - julho de 2014
São Paulo




Uma descida no poço profundo tendo como coadjuvantes
os universos institucionalizados fechados dos consultórios
e do ambiente familiar, em forma de poliedros.






            O que me inquieta e fascina no relato autobiográfico de Katrina Petra, uma escritora que melhor retratou o drama psicológico de quem sofre e sente na pele, o (de)precipício poente da depressão. Um denso mundo de sofrimento, de angústia e de insegurança por não saber como vai acordar no próximo dia. Em seu primeiro livro permeia um clima de medo, de ansiedade, repleto de alucinações proporcionadas pelas altas dosagens de medicamentos, entrecortado pelos depoimentos sinceros, claros e corajosos ao expor as reações dos psicanalistas, do apoio incondicional dos cunhados e o estigma dos colegas de profissão, pois teve que interromper uma carreira como educadora. Gradativamente, percebe-se uma realidade essencial e, ao mesmo tempo, cruel quanto à incompreensão da medicina, da família e da sociedade em geral acerca de quem vive num mundo à parte e exilado nos labirintos da mente. Neste caleidoscópio de imagens, de pesquisa e estudo da autora, encontram-se a busca, a dor, o sonho, a ousadia, a coragem e o amor humano, elementos que compõem os fragmentos de um mosaico. Uma descida no poço profundo tendo como coadjuvantes os universos institucionalizados fechados dos consultórios e do ambiente familiar, em forma de poliedros.
            A escritora sustenta uma relação intensa no desejo de superar o suplício da dor, penetrar no mais recôndito da natureza humana, traduzir as pulsações em palavras, frases e imagens, presentes em todo o seu livro. A literatura é uma forma de se afirmar frente ao mundo obscuro e absurdo, e de transformá-lo. A escrita e a literatura assumem uma dimensão totalizante na sua vida. É uma paixão, uma resposta a uma necessidade irresistível, irrompendo do calabouço de seu inconsciente que a envolve e a domina.
            Como uma repórter fotográfica, Katrina Petra desvenda o desejo reprimido pela mãe, o choque pela doença da filha, e as suas fantasias num mundo opressivo que cobra tarefas, mas oferece poucas alternativas concretas e viáveis de fugir dele. Um retrato sobre a educação, os costumes e as tradições de uma sociedade e uma instituição doente e preconceituosa.










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