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Outro lado da história


Benjamin Resende, autor de Raízes Prudentinas


                 
  
             Com o mais profundo respeito e admiração, venho sugerir ao memorialista Benjamin Resende, autor do livro Raízes Prudentinas, que estude a possibilidade de incluir em seus escritos os fatos da vida artística e boêmia de Presidente Prudente e arredores. De minha parte, acredito que seria uma grande injustiça, falta de respeito, e preconceito, deixar de buscar nas gavetas do esquecimento, os atores e atrizes amadores das radionovelas, a principal mola propulsora da televisão e teatro nos dias de hoje, os colaboradores de jornais e rádios (cronistas e poetas), os operadores de mesa de som, sonoplastas, entre tantos outros personagens de bastidores de produção que, infelizmente, por falta de estrutura, incentivo e vontade política em resgatar a memória e identidade, grande parte caiu no ostracismo, ou esquecimento.
      Na área musical, aqueles que criam os jingles e a trilha do espetáculo, citaremos os violonistas Humberto Marinelli Sobrinho, maestro Zito e seu Conjunto, Irineu Rocha, Jotacê Cardoso, Gavião, o baterista, Jota Moraes, ao piano e, mais recentemente, nos festivais dos anos 70, os compositores Rubens Faria de Barros (irmão do Sérgio e do Afrânio e, também filhos do Gercino e da mestre Helena Faria de Barros) e Heraldo Faria. Os quatro primeiros instrumentistas animavam os programas de auditório na fase de ouro do rádio prudentino. No mesmo segmento, havia os que embalavam as noites românticas de serestas, como o gráfico José Barbato, entrecortados por brilhantes declamadores de poesias e sonetos de Ratib Buchalla, Camões, Olavo Bilac, Gonçalves Dias e Guilherme de Almeida.
      Quanto à imprensa, professor Benjamin, deve rememorar todo o ideal, empenho e talento dos jornalistas e radialistas, devem figurar na galeria: Gabriel Octávio de Souza, que usava o pseudônimo de Ptolomeu, no extinto Correio da Sorocabana, Joaquim Zeferino Nascimento, excelente orador político, jornalista e escritor, ex-assessor de Juscelino Kubitschek, uma figura única, pois sua vida sufocante está repleta de fatos cômicos, dramáticos e curiosos, merecedor de uma longa biografia, porque faleceu há algum tempo. Rafael De Lala, autodidata, profundo conhecedor de política e sociologia. Existem alguns desenhistas, do período de 40 a 70, do tempo em que se montavam os anúncios usando a tinta nanquim e a tipologia era desenhada com lápis, régua, compasso, transferidor e borracha branca.
      Nem se preocupe com o estilo, uma “maneira” de fazer a crônica, seja na inserção do depoimento biográfico ou sob a aparência do comentário despretensioso, equilibrando a transcrição do fato e a revelação de momentos hilários, fotográficos, poéticos e sensoriais. Por isso, a sua expressão – embora mantenha a objetividade própria do estilo – abriga a complexidade da vida, não recue diante dos fatos, dos sentimentos contraditórios ou vagos. Isto faz a sua escrita adquirir uma densidade rara na média da literatura prudentina.
      Na verdade, seja o fotógrafo do mar de concreto, traduza simbolicamente, com tanta limpidez, ao fazê-lo signo da permanência na antítese da vida banalizada. E, sim, sendo uma vida mais despojada, natural, sem retórica, eliminando as falsas exaltações e o ufanismo gratuito dos “ídolos de barro”. O resgate dos mitos que, já na fronteira do imaginário, preencherá a insuficiência do real, assim como a no texto o mito da mulher: “avideusa evanescente e eterna” também há o do oceano em fúria, que desencadeará sobre Copacabana a multidão de suas ondas”, conforme trecho de uma crônica de Rubem Braga. Mas, hoje, oferece ao narrador a sua brisa e, com ela, um sossego, uma tristeza, um perdão, uma paciência e uma tímida esperança. E que, a mesma, possa brotar nas novas gerações de artistas, dentre outras profissões.
      Mesmo que a muitos este universo literário, artístico e histórico, talvez, pareça piegas, excêntrico, frívolo, provinciano, áspero e indivualista. Nem por isso será menos verdadeiro: e tudo, nestes escritos, estará perfeito porque alicerçado na fidelidade que cada Homem deve a si mesmo.


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