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Ossada de Lorca V



Um poeta em Nova York de Federico García Lorca










As armas se gastam ou se quebram,
a marca permanece inscrita
do que passou
em valas.
Assim teus traços, como o mais,
se apagam.
A feição que na terra se finca
nada consegue apagar,
eternizada nas visões profundas,
vistas ou não
de tudo o mais desconhecido
escureja, denso,
encobre os cadafalsos,
os desertos e o despenhadeiro
ladeiam teu abandono.
Enquanto alguém recolheu teus ossos
restos precursores, o mito
fazemos o nosso
um movimento a mais entre tremores
não os tiveste porque não te cabia.
Nada mais que quase
encontraste à frente o fim que não buscaras,
mas findar te pareceu demais
ter estado diante do mundo
eras o que fizeste: preparar
o encontro com aquele universo
dos monstros todos reunidos
em chão escuro.
Muita terra se quís nas noites
aquelas que se foram buscar
no dia que não se tem
e não veio, existe a exaltação das trevas
em que o sonho foi buscar a luz
do dia que não vem.








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