Os fragmentos que ficaram mostram
que todos os riscos
foram assumidos
Nada de ladainhas ou louvaminhas
para Mário Faustino: o defunto não gostava dessas coisas. A enxurrada
laudatória a que a oportuníssima reedição de sua poesia deu ensejo, desmerece o
rigor e a honestidade do grande crítico que ele foi. Organizando de 56 a 58, a
página semanal “Poesia-Experiência” no Jornal do Brasil, o melhor suplemento
poético (com poesia, crítica e tradução) que já houve no País. Faustino, que
sempre foi duro com toda a criação alheia, sobretudo a dos poetas consagrados
(Drummond, Cabral e Bandeira, por exemplo) que hoje em dia ninguém ousa
criticar, jamais teria se rebaixado à autocomplacência.
Convém, portanto, reconhecer, além
de suas marcas de grandeza, seus evidentes sinais de fracasso. Embora sua obra
estivesse em nítida evolução quando de sua morte prematura, aos 32 anos, (em
1962, num acidente aéreo no Peru), ela só pode ser julgada pelo que é, não pelo
que poderia ter sido. Se há algo que está à raiz, tanto de seus sucessos quanto
de seus fracassos, é a sua imensa ambição. Toda a poesia escrita que ele deixou
não passava de um conjunto de esboços, ensaios, tentativas na direção de seu
proclamado projeto de criar uma grande obra, grande qualitativa e
quantitativamente, o “poema longo”.
Para a sua consecução, o poeta não
se furtou a nenhum dos perigos que ameaçam empresa tão arriscada: o ridículo, a
pieguice, o sem sentido. Impossível saber se seu projeto triunfaria, mas os
fragmentos que ficaram mostram que todos os riscos foram assumidos. Primeiro a
reconhecer o fato, ele sempre reafirmou o caráter não definitivo de seus
esboços. Mesmo os poemas mais acabados e realizados, contidos no seu único
livro publicado, O homem e sua hora (1955), patenteiam a
sua disposição de sempre sacrificar a possível perfeição menor de um poema
qualquer em prol de experiências que contribuíssem para seu projeto maior. Cada
um de seus poemas transpira o afã abnegado de uma autotranscendência em direção
ao “poema longo”.
As marcas de sua grandeza estão,
assim, inscritas negativamente no modo como o poeta abriu mão da facilidade de
uma boa qualidade tímida - embora muitos de seus poemas sejam de fato bons -
para se arriscar a uma grandeza difícil, cujo sucesso, é óbvio, não estava dado
de antemão. Mas não é só esta indagação suspensa para sempre que torna
lamentável seu desaparecimento do cenário poético nacional. Sendo o principal
interlocutor da vanguarda dos anos 50, a Poesia Concreta, sua ausência
privou-nos a todos de um diálogo que poderia ter mudado os rumos da literatura
brasileira muito mais rapidamente. As divergências entre Faustino e os poetas
concretos, tendo uma base cultural comum, eram dialéticas e se a discussão
tivesse podido prosseguir, teria enriquecido ambas as vertentes.
MELHORES POEMAS
Mário Faustino
Seleção
de Benedito Nunes
Direção
Edla Van Steen
112
páginas
Global
Editora
3ª
edição
2009
São
Paulo - SP
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