As ruas iam se enchendo, cada vez
mais intransitáveis. Vieram os primeiros grandes problemas de circulação. E, de
repente, os meus rostos, aqueles que eu via diariamente, quase que às mesmas
horas, em situações idênticas, passaram a desaparecer como se esvaíssem em
plena neblina.
Sol escaldante, ar seco, eram sensações
que me tomavam, quando encarava a multidão, compacta, fechada, mais fechada.
Andávamos ombro a ombro, rosto a rosto, e ninguém se encarava. Olhavam para os
lados ou para o chão.
Tais climas se espalham, como fluidos,
dominam a atmosfera. Tocam as pessoas, instalam-se nelas, com a umidade, o frio
e o calor. Dominam, simplesmente.
Agora sei. Essas noites longas e
silenciosas eram de aturdimento. Ficávamos na cama, de mãos dadas, contemplando
o teto, ouvindo os barulhos da rua.
Não ousávamos nem mesmo olhar à janela.
Não era piedade. Puro medo. Igual aos vizinhos das casas e dos prédios, da
quadra.
Não ter com quem dividir esta angústia
me deixa mais sozinho. É uma atitude egoísta, eu sei. Eu não posso fazer nada,
assim me sinto. Houve um tempo, é esse antigamente, a possibilidade de divisão.
Dor e alegria eram repartidas, porque se vivia em comunidade.
Estávamos juntos, podíamos contar uns
com os outros. E isto tornava tudo mais fácil, suportável. Bastava abrir a
porta, tocar campainhas, correr a um portão, tocar um telefone, as pessoas se
juntavam, partilhavam. Helena percebeu a perda de tudo isto bem antes de mim.
O sentimento de solidão era menor, não
estávamos encerrados atrás de quatro paredes, portas trancadas, corredores
vazios. Os ruídos exteriores eram normais, não traziam medo. As pessoas podiam
se olhar, cara a cara, enfrentar-se sem receios, a língua seca, o coração
disparado.
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