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O Furacão Jorge na Colmeia





Mautner criou um estilo fora dos padrões acadêmicos











O documentário “Filho do Holocausto”, de Pedro Bial, propõe uma releitura de um dos escritores brasileiros mais importantes que surgiram na década de cinquenta. Jorge Mautner ao lado de Cláudio Willer, Roberto Piva, Rodrigo de Haro, Roberto Bicelli e Raul Fiker, esses enfantes terribles acreditavam no desregramento de comportamentos e, por isso, sempre tiveram choque com a esquerda e a direita no Brasil. Tanto pelos seus estilos como pela suas temáticas, seus textos antigos podem ser hoje lidos por um público melhor preparado para compreendê-los e, sobretudo, pelos jovens intelectuais e pesquisadores.
Entre os vários temas de vital importância ao Homem na sociedade, refletidos por Mautner em seus livros, podemos destacar o perigo da guerra nuclear, uma de suas preocupações fundamentais do seu Kaos (Kristo Ama Ondas Sonoras), porém, temo pelo conflito nos países do Oriente. Acredito que diminuiu ante a tomada de consciência antinuclear que empolgou a Europa e agora também se afirma poderosamente nos Estados Unidos, com as derrotas dos setores mais reacionários e belicistas do capitalismo ianque. Previu a estética da miséria na televisão, com o que intitula de “videotices”, a inclusão do teatro da crueldade de Antonin Artaud com notícias e filmes contendo violência gratuita, um verdadeiro show de barbaridades grotescas proporcionadas pelo circo de bizarrices e fora dos limites humanos, além do vazio mental ocasionado pelo excesso de propagandas coloridas e cheias de efeitos visuais que estimulam o consumo compulsivo sem medidas.
Em 1957, aos 17 anos, Jorge Mautner escrevia poemas para a revista “Diálogo”, enquanto Caetano Veloso cantava sua composição “Vampiro” de óculos escuros na TV Paulista. Quatro anos mais tarde, chocava a arte brasileira com seu romance de estreia: “Deus da Chuva e da Morte” (valeu-lhe o prêmio Jabuti, como melhor autor-revelação), mergulhado sob um forte existencialismo e de revelações proféticas, alerta sobre o perigo de uma guerra nuclear. Em mais de cinquenta anos, Mautner viu surgir os maiores movimentos culturais e acontecimentos políticos do Brasil, da voz desafinada de João Gilberto, no início da Bossa-Nova, o “Cinema-Novo”, de Glauber Rocha, Rogério Sganzerla,  etc. Sentiu na pele a alta tensão do golpe de 1964, a ideologia de revolver o mundo pelo movimento “Tropicália”, que teve como mentores o ilustrador Rogério Duarte, Gilberto Gil, Caetano Veloso, Torquato Neto e outros como porta-vozes.
Atualmente, um dos artistas mais admirados no cenário da música, consciente de seu compromisso no mundo, tem uma inteligência muito elevada que o leva debater com qualquer acadêmico. Possui uma seleção de sucessos como: “Vampiro”, no cd Cinema Transcendental de Caetano Veloso, “Maracatu Atômico”, em versões de Gilberto Gil e Chico Science & Nação Zumbi, “Negros Blues”, “A Lenda do Pégaso”, gravada no cd Bazar Brasileiro de Moraes Moreira, e outras gravadas nos anos 80: “Viajante”, na voz de Raimundo Fagner, “Orquídea Negra”, por Zé Ramalho e “Hino de São Jorge”, por Amelinha.
Mautner rejeita qualquer sentimento de marginal ou maldito, como o classificam, ao contrário, diz ser um filho predileto de Xangô, e que sabe mexer com a abelha (as massas), com o olho do ciclone, mas ficando protegido.


Livros Publicados:


Mitologia do Kaos – Obras Completas – Editora Azougue, 2002;
Floresta Verde Esmeralda, Texto Inédito incluído em Mitologia do Kaos;
Fragmentos de Sabonete e Outros Fragmentos – Editora Relume Dumará, 1995;
Miséria Dourada – Editora Maltese, 1993;
Fundamentos do Kaos – Ched Editorial, 1985;
Sexo do Crepúsculo – Editorial Global Ground, 1982;
Poesias de Amor e Morte – Editorial Global Ground, 1982;
Panfletos da Nova Era – Editora Global, 1978;
Fragmentos de Sabonete – Editora Ground Informação, 1973;
O Vigarista Jorge – Von Schmidt Editora – 1965;
Narciso em Tarde Cinza – Editora Exposição do Livro, 1965;
Deus da Chuva e da Morte - Editora Martins, 1962.


Discografia:



Revirão, 2007;
Eu não Peço Desculpa – junto com Caetano Veloso, 2002;
Mitologia do Caos, 2002;
O ser da Tempestade – 40 Anos de Carreira, 1999;
Estilhaços de Paixão, 1996;
Pedra Bruta, 1992;
Árvore da Vida - Jorge Mautner e Nelson Jacobina, 1988;
O Antimaldito, 1985;
Bomba das Estrelas, 1981;
Samba dos Animais – LP Onu-Unesco - Declaração dos Direitos Humanos, 1979;
Filho Predileto de Xangô, 1978 - compacto;
Mil e Uma Noites de Bagdá, 1976;
Relaxa, Meu Bem, Relaxa, compacto, 1975;
Bem-Te-Viu, compacto, 1974;
Rock da Barata, compacto, 1973;
Para Iluminar a Cidade, 1972;
Radioatividade – Não, Não, Não, compacto com duas músicas, 1966.


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