Ela traz confortos antes inimagináveis e certamente
implica perdas
Nos anos 70, a gente se deliciava com
a tecnologia dos Jetsons, desenho animado, de Hanna Barbera, sobre os costumes
de uma família burguesa no futuro, era um ingênuo sonho futurista, penso hoje.
Mas a alma dos Jetsons não mudava mesmo com toda a tecnologia.
Nos anos 2000, navegar na internet
tornou-se uma contradição entre manter comunicação simultânea com milhares de
pessoas em várias partes do planeta e estar só? Cheguei à conclusão de que a
ampliação do uso da internet produz isolamento. O internauta dedica menos tempo
a seus familiares, a seus amigos, isto é àquelas relações sociais de pessoa
para pessoa. Para melhor avaliar a conclusão, preciso retirar boa dose de
ingenuidade que esse tipo de reflexão engendra. É perfeitamente razoável deduzir
que há mais tempo despendido com uma certa atividade (tipo a elaboração de um
projeto gráfico) corresponda menos dedicação ao conjunto das outras.
Influenciado pelos pesquisadores norte-americanos em geral sou obcecado pela
prova estatística.
Enquanto os números não mostrarem, o
fenômeno não existe para mim. Pelo que vejo, há uma inquietação, uma angústia:
“Seremos milhões de pessoas praticamente sem interação social?”, deixo a
pergunta como usuário. Está aí um tema que vale a pena discutir. E, diga-se,
não inaugurei o debate, que tem seus 153 anos, se não mais. É uma preocupação
que nasce com a modernidade, com a sociedade de massas, com as primeiras
metrópoles européias, Paris e Londres.
Em meio à multidão, o indivíduo está
só. Ele cruza diariamente com centenas de pessoas que não conhece. Essas
pessoas vivem no mesmo meio, mas não convivem. A mesma metrópole produz as
massas e isola a pessoa. Nesse contexto, surgem, especialmente na literatura,
temas que questionam a perda dos laços sociais tradicionais e apontam a
banalização da vida nas grandes cidades. E, se relacionarmos o tempo de conexão
na internet com a maior propensão para crises de depressão. Os novos hábitos,
assim, seriam doentios, me preocupa o impacto do ser humano da monumental arquitetura
moderna, com seus imensos espaços vazios, suas largas avenidas, que nos faz
sentir dentro de um labirinto, associa-se ao medo de lugares públicos, um tipo
de misantropia. Portanto, no debate sobre novas tecnologias que isolam o ser
humano, a Internet é apenas uma continuação. Decerto, apresenta características
próprias. Ao contrário da arquitetura urbana, feita de espaços concretos,
palpáveis, a rede de computadores é lugar etéreo.
Porém, as manifestações reticentes
sobre o que se perde ao adentrar a era da informática são uma versão atualizada
da velha insegurança (falta de leis específicas quanto à privacidade e aos
meios de fiscalizar e punir os hacker´s que criam vírus, direitos autorais
entre outras.) em transitar para um mundo menos conhecido. Um mundo que,
manipulado por grupos terroristas, pode causar bilhões em prejuízo, destruir
vidas inocentes apenas digitando no teclado e entrando no sistema da Polícia
Federal ou do FBI, tornando nossa vida um inferno! Como a Terceira Grande
Guerra Mundial via net!
Do mesmo modo que a grande cidade e as
multidões não significaram a hecatombe ou o paraíso do gênero humano, existem
razões para supor que o mundo da Internet modifique, para pior ou melhor, a
humanidade. Ela traz confortos antes inimagináveis e certamente implica perdas.
Mas, construir um mundo mais harmonioso não tem relação com as máquinas, com as
tecnologias. Debater a Internet não é nenhum bicho de sete cabeças. O problema
é que, às vezes, fica mais fácil eleger um vilão do que encarar toda a miséria
que nos cerca.
Este
artigo pertence ao livro “Religar às Origens” ( 1981 - 2010 – Ensaios e Artigos),
da Editora Clube de Autores, de São Paulo. Para mais informações, clique e
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