Todo um mundo subterrâneo
que do seu jeito, busca a luz
A pichação
representa uma das expressões mais visíveis da invisibilidade humana. Seria
mais do que rabiscos, uma forma de estabelecer uma relação de pertencimento com
a comunidade – mesmo que por meio de agressão – e, ao mesmo tempo, de dar ao
autor um sentido de autoidentidade. Naqueles garranchos incompreensíveis para
muitos, a arte mistura-se à necessidade de dizer simplesmente “eu existo,
preste atenção em mim.” Note-se que os pichadores não subiram nos prédios para
assaltar, mas apenas para desenhar.
Esse grito de existência, em forma
de letras constitui, portanto, a busca de uma aceitação, mas usando a
transgressão. E, nisso, surge um foco de tensão. Desconta-se a transgressão na
sociedade que exclui, enquanto num círculo vicioso, os garranchos mantém os
pichadores excluídos. Quem não vê a pichação por esse lado, não entende todo um
mundo subterrâneo que do seu jeito, busca a luz.
Mas a
pichação – e aí está seu lado mais polêmico – acaba por impingir, na marra, sem
direito à opção, uma estética obrigando o dono de um muro ou da fachada de uma
casa a aceitar aquela expressão, como se tivesse de ostentar a lembrança da
marginalidade alheia. Se muitos são movidos por um direito ferido – o da
expressão –, eles negam o direito dos outros de pintar suas casas como bem
entenderem.
Há algum tempo, no Brasil, houve uma
experiência na qual os pichadores são convidados a estilizar suas letras e
queimá-las em cerâmica, para recuperar os muros do cemitério São Paulo, na Vila
Madalena. A autorização para as intervenções não os afastou. Pelo contrário.
Até ficaram satisfeitos em ver as letras ampliadas, muito visíveis e coloridas,
como parte de uma grande instalação. Como estão feitos em cerâmica, aqueles
desenhos deixam de ser passageiros. Ganham mais permanência. A transgressão no
caso, soube encontrar um ponto de equilíbrio com a comunidade.
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