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Roda ao Redor II














Os momentos em que determinamos
as transformações através de um gesto,
ou a falta deste, palavra ou pensamento,
sem ter a consciência desta determinação













           Hoje, estive relando as matérias sobre a deterioração dos arquivos de jornais antigos no Museu Histórico. Esbocei algumas cenas para um filme sobre o descaso, a violência e o problema da falta de preservar a memória. Estes temas fascinam-me, porque jamais entraram em minha vida, conheço todos: Eu me refiro à violência e à morte. Não à violência que é só o arrebatamento de situações, uma dor interna. Pode-se pensar que os funcionários do museu não têm equipamento e estrutura para conservar e manter o arquivo. Ou por falta de mão-de-obra qualificada. Uma questão que envolve também falta de cultura, educação e vontade política.
            A história morrer assim, sem que ao menos as novas gerações conheçam a história da imprensa, que saibam da sua identidade, deve ser uma situação estranha pois a morte anula, de qualquer modo, a identidade. É outra coisa que quero exprimir e não consigo. A história esfacelando torna-se um duplo zero. Porque tem menos a vida e o nome que a marcava, fazendo-os a sua confirmação. Uma cidade média nada abalada por uma tragédia. Esta será o fato/personagem. Se eu revirar as suas histórias elas vão compor dois momentos.
            Estes instantes é que me fascinam. Os momentos em que determinamos as transformações através de um gesto, ou a falta deste, palavra ou pensamento, sem ter a consciência de tal determinação. Não consigo sair das primeiras sequências, giro em torno delas, não sei continuar. Tudo está terminando. O filme deve se desenrolar num dia apenas. Desse dia desenvolvo tudo.
            O que me adianta produzir um filme digital, em alta definição, aqui, distante de tudo? Quem é que pode me ajudar? Tenho uma pilha de rascunhos e roteiros na cabeça.








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