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Movimento, Memória e Tradição





Capa do caderno especial do Suplemento









A revista Verde representou a conquista do interior brasileiro
e rejuvenescimento do Modernismo









           
           

            Em novembro de 2013, o Suplemento Literário de Minas Gerais, de Belo Horizonte, lançou uma edição especial que se chama A Modernidade Perene de Cataguases, organizada por Ronaldo Werneck. A produção do caderno teve a parceria entre a Secretaria de Estado de Cultura, Governo e Imprensa Oficial do Estado de Minas Gerais.
            A contribuição de Minas para o Movimento Modernista não surgiu nem em Belo Horizonte, sua capital administrativa, nem em Juiz de Fora, sua capital industrial; surgiu numa cidadezinha singela, mas cheia de espírito progressista, com a revista Verde, de Cataguases, em Minas Gerais.
            O ano de 1927 tornou-se um marco histórico para Cataguases, porque a vanguarda literária do Brasil olhou para a cidade, tornando a sua presença obrigatória nos compêndios sobre o modernismo brasileiro. Rosário Fusco, Henrique de Resende, Francisco Inácio Peixoto, Guilhermino César e Ascânio Lopes inventaram e lideraram o movimento que ofereceu ao País a "Revista Verde", uma publicação modernista nascida no interior de Minas. Para se entender a "Verde" como resultado dos objetivos de um grupo, e não um evento episódico, ou acontecimento pitoresco por sua jovialidade e origem, os textos do caderno discorrem sobre a trajetória, o pensamento e o estilo dos futuros integrantes da revista. Quando seu processo de maturação é colocado, a revista adquire feição de fruto de um trabalho persistente. A "Verde" contribuiu para a solidificação do movimento modernista em termos nacionais: representou a conquista do interior brasileiro e o rejuvenescimento do modernismo.
            A escolha da cultura produzida em Cataguases, para uma edição comemorativa veio, num primeiro momento, do desejo de visitar novas paragens, para além do circuito das culturas mais largamente centralizadas e divulgadas no Brasil, como em São Paulo, Rio de Janeiro e Curitiba, no Paraná. A necessidade de transpor as fronteiras do “acostumado” eixo foi a de buscar em produções literárias que por aqui ainda correm subterrâneas e à margem, como no caso a do interior mineiro, um respiro, e, em se tratando de um caderno de poesia, prosa e cinema, de não se repetir.
            Ao travar conhecimento com a sua produção cultural, percebemos estar diante de uma seara literária maior e mais vasta do que supúnhamos, a princípio. Muitos dos nomes que já faziam parte de nosso repertório, como Ascânio Lopes, Guilhermino César e Rosário Fusco (que traduziu clássicos da literatura, realizou diversos romances como "O Agressor", um dos primeiros representantes brasileiros do realismo fantástico.) revelaram-se grandes surpresas, uma vez lidos e observados mais a fundo. Outros que conhecíamos bem pouco, como Henrique de Resende, e outros que desconhecíamos por completo, também nos foi possível ler, em grande parte dispersos nos jornais, cadernos e boletins informativos de associações de escritores.
            Sempre tentado a visitar, como leitor e pesquisador a refletir a história de Cataguases, da qual esses nomes são importantes testemunhas e agentes. O contato com outras expressões artísticas, como a pintura e a música, mantendo relação com o contexto em que se movem essas personagens, também se somou à experiência como um ingrediente de imersão. Merecem destaque também na edição, os poemas inéditos de Guimarães Rosa – dedicados ao poeta cataguasense Francisco Marcelo Cabral – e crônicas do adolescente Chico Buarque de Hollanda, pela primeira vez impressas, quando ele era estudante interno no Colégio Cataguases, projetado por Oscar Niemeyer.
            Dessa forma, a produção literária da cidade mineira constitui um conjunto – o que naturalmente está ligada a um aspecto cronológico e ao contexto de uma época – rico em sua multiplicidade de vozes e olhares, e que parece estar, direta ou indiretamente, em permanente diálogo.







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