(Décima quarta parte)
Anísio
Teixeira, em meio a esse cenário adverso, influenciado pela experiência nos
Estados Unidos, defende propostas de descentralização da Educação. Sua
pregação, como ele mesmo define “mais política do que educacional”, não
encontra muita ressonância entre as correntes intelectuais da época,
comprometidas que estavam com as propostas de centralização e fortalecimento do
Estado Nacional, como ressalta Lahuerta (1998);
Em
outras palavras, mesmo os que não aderiram explicitamente ao Estado Novo, de
uma maneira ou de outra, adequaram-se ao seu projeto de ordem revelando uma aceitação
tácita do autoritarismo que tinha por eixo a “compreensão de que o “atraso” da
nação estava, bem ou mal, sendo sanado pela imposição de uma ditadura que
acertava o passo dentro das exigências do progresso”. Ainda que por linhas
tortas, caminhávamos para o moderno (p. 110).
O
movimento de descentralização, devido a sua íntima associação com o regime da
Primeira República, não empolga como bandeira política no país. O momento é de
enfraquecimento do ideário liberal e de retorno de concepções positivistas, que
pregam a constituição de um Estado forte e centralizador. Essas concepções,
como ressalta Moraes (1998), que têm como foco principal o exército brasileiro,
constituem, naquele momento de incerteza e crise, um “porto seguro” contra as
mudanças revolucionárias que poderiam advir daquela situação de crise:
Promover o progresso da
corporação armada do Estado mantendo tal e qual a ordem social vigente:
manifestadamente, o projeto de reforma do Exército cai avant la letre na
categoria da modernização conservadora, sistematicamente elaborada por
Barrington Moore em seu conhecido Social of Origins of Dictatorship and
Democracy. Antes dele, entretanto, este peculiar processo de mudança parcial na
continuidade global já havia sido estudado em aspectos essenciais por alguns
dos maiores teóricos marxistas do século XX, notadamente por Lênin a propósito
da “via prussiana” de desenvolvimento do capitalismo na agricultura e por Gramsci
(a “revolução passiva” e temas conexos) (Moraes, 1998, p. 82).
Observadas
as atitudes de Anísio Teixeira e, também, as suas oposições e identidades com outros
intérpretes da situação brasileira, fica evidente que a sua é quase uma voz
isolada em defesa da descentralização e do regime democrático no Brasil.
Os
contornos da crise no Brasil conduziram as principais correntes intelectuais,
praticamente, a um consenso no que diz respeito ao papel de “partido de
governo” do Estado, na sociedade, como ressalta Lahuerta (1998).
A
função de partido de governo, exercida pelo Estado Novo, é uma obra intelectual
de fôlego, na medida em que mobiliza e submete vontades dispersas em torno de
um projeto unificador, [...] Desenvolvimento, progresso, modernidade, superação
do “atraso” nacional, essas são algumas das bandeiras perseguidas pelo que há
de melhor na intelectualidade [...] É assim que num contexto de
revolução–passiva, constitui-se um universo paradoxal que dá forma a uma cultura
política estatista, antimercado e, sob uma série de aspectos, anticapitalista.
Em nome da ordem e da tradição, do projeto e da cultura nacional, afirmou-se um
caminho para a acumulação capitalista, mas isso não significou nem o
fortalecimento imediato do universo mercantil, nem o reconhecimento positivo do
interesse e do empreendimento individuais, à margem e até contra o Estado, que
continua ainda muito precário. Fragilidade do mercado, desenvolvimento capitalista
concebido como obra pública, dificuldade de o individualismo se afirmar como
valor legítimo, condições nas quais as ideologias integrativas, ao menos entre
intelectuais, vão ter enorme ressonância e a “ida ao povo” será a forma mais
frequente e recorrente nas tentativas da intelectualidade resolver a questão de
sua identidade social (pp. 107-108).
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