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Makarenko e a pedagogia da vida (4)

 

Homenagem em selo da Rússia

(Quarta e última parte)

A partir de uma série de discussões sobre textos de diversos pedagogos, incluindo Freinet, Makarenko e outros, buscou-se elaborar uma identificação, ainda que superficial, daquela clientela com um discurso que procurasse estimular a auto-identificação dos meninos e a autoorganização. O miolo disso era a intenção de estimular a discussão de uma espécie de Pedagogia do trabalho.

Os resultados do trabalho foram pequenos, pela rotatividade do corpo técnico da Febem e pelos limites impostos pelo Estado. Posteriormente, um dos membros desse grupo, Antonio Carlos Gomes da Silva, que depois ocuparia o cargo de presidente da Febem, em Minas Gerais, sintetizou esse debate num livro intitulado Pedagogia do trabalho – Diretrizes, editado pela Funabem.

Encontro casual

Editada no Brasil somente em 1984, numa bem cuidada tradução de Tatiana Belinky, direto do russo, até então circulava no país apenas a versão portuguesa da obra de Makarenko. Em 1985, numa das estantes das Escolas Oficinas do Estado, o menor carente, P.C., então com 15 anos, descobriu o Poema pedagógico, já bastante utilizado pela professora Heloysa Dantas em seus debates na Faculdade de Pedagogia da USP.

O efeito dessa leitura sobre P. C., que vivera dos três meses de idade até fugir, aos 13 anos, trancafiado na Unidade Itapetininga da Febem, foi transformador. Associando o Poema pedagógico de Makarenko a outras leituras sobre menores, como o Capitães de Areia, de Jorge Amado, P. passou a questionar o tratamento recebido na instituição e ficou sensibilizado com a atitude de Makarenko, que não era paternalista, mas também não era sádico, criando então coragem para escrever seu livro-depoimento, Mais que a realidade, publicado pela Editora Cortez, em 1987. A partir dessas leituras entendeu que seria fruto desse regime e que não deve ser tratado como coitadinho ou como trombadinha. Quando P. C. lançou o livro sentiu-se usado.

 


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